sexta-feira, 3 de junho de 2016

Estupro não é sobre tesão, é sobre dominação!

Na manhã de ontem (25/05) foi divulgado um vídeo de uma mulher após um estupro. O vídeo foi divulgado por um dos estupradores. A menina de 17 anos foi estuprada por 30 homens, que se gabavam disso em suas redes sociais. Certamente não se gabavam (apenas) pela impunidade, mas pela naturalidade/normalidade que o estupro toma em nossa sociedade. Ao olhar desses homens nossos corpos são objetos a serem tomados, possuídos por eles como e quando quiserem. Mas esses 30 homens não são exceções. Esses 30 homens não são doentes. Esses são 30 dos homens que uma sociedade misógina produz. Os homens não são ensinados a nos amar e a nos respeitar, a nos admirar. Os homens admiram homens, querem ser como seus pais, querem ser como seus amigos, como os autores de livros que leem, como os super heróis de quadrinhos que leem, de filmes que assistem. Os homens aprendem a amar, a respeitar e a admirar outros homens, especialmente pela sua dominação, especialmente pelo exercício de poder sobre outros corpos, a quem vão julgar inferiores. Os homens são ensinados a desrespeitar e a odiar mulheres, principalmente quando essas mulheres se recusam a ser dominadas por eles ou a preencher o papel que eles exigem que as mulheres tenham.
Somos objetos sexuais - pq eles aprendem a amar homens e também aprendem a dominar sexualmente nossos corpos. Não quer dizer que eles não possam quebrar isso e agir de forma diferente, mas quer dizer que eles naturalizam e normalizam o estupro porque é esse o lugar que as mulheres têm para eles: pedaços de carne para satisfazer todo desejo e perversidade deles. Estupro não é sobre sexo e tesão. Estupro é sobre violência, é sobre dominação, é sobre constantemente nos lembrar "quem é que manda", quem está no topo da cadeia "alimentar". É para nos lembrar que eles podem tirar nossas vidas a qualquer momento e que sejamos "gratas" por eles não fazerem isso. O estupro é mais do que uma violência sexual contra uma mulher específica, estupro é uma violência simbólica, uma ameaça real a todas as mulheres e a todas as pessoas trans - para que lembremos todas que nossas vidas, nossos corpos, nossa integridade física pertencem a eles, que podem tirá-las quando quiserem.
Estamos todas indignadas, estamos todas entaladas com o estupro coletivo dessa menina em nossas gargantas. Temos o medo marcado em nossas subjetividades. Toda mulher pode ser estuprada, seja rica ou pobre; esteja andando sozinha ou acompanhada na rua; esteja vestindo burca ou shortinho; seja gorda, magra, alta ou baixa; seja de dia, seja de noite; seja qual for sua profissão ou ocupação; onde quer que more, viva, estude, trabalhe; seja qual for o ambiente que frequente. Para nós não há espaço público separado do espaço privado, não estamos seguras sequer em nossas casas, com nossos pais, tios, sobrinhos, avôs, maridos, namorados, filhos, melhores amigos ou companheiros de trabalho: 70% dos estupros ocorrem em casa, por familiares, parentes, amigos ou pessoas conhecidas e próximas.
Não estamos seguras, não estaremos enquanto formos vistas como objetos e os homens como portadores/proprietários de objetos. De que forma, então, podemos conseguir viver o dia a dia no medo e na insegurança? Nos cuidando umas às outras, nos aproximando umas das outras, nos organizando. Seja na luta de sobrevivência diária, seja em movimentos sociais, em manifestações de rua, precisamos estar atentas para cuidar uma das outras, dependemos nós de nós. Se qualquer dia você vir uma mulher ou pessoa trans incomodada com a aproximação de um cara, não vire o rosto, não se afaste, se aproxime, se coloque a disposição dela, se faça presente, vigie. Você pode salvar uma vida.
*Como vc homem podem agir para contribuir em reduzir nosso medo e insegurança? Não nos aborde sem ser convidado. Se estivermos sozinhas na rua, seja uma rua pouco movimentada ou a noite, especialmente aí nao nos aborde. Se estivermos em grupo, pergunte antes se pode conversar conosco. Se vc presenciar uma abordagem que pareça causar desconforto a uma mulher, se faça presente, primeiro a distância, mas se a abordagem for insistente se aproxime e mostre a ela que está atento e disponível a ajudar, caso ela queira. Se ouvir seus amigos ou colegas de trabalho falando de mulheres como objetos, interfira, seja o chato do grupo. Se vir um amigo ou até um desconhecido forçando beijar ou agarrando uma mulher que aparenta não estar consciente ou ter pouca consciência, tire seu amigo, ajude a menina a encontrar os amigos dela ou o caminho de casa. Se você for professor, sugira livros de autoras mulheres, filmes com protagonismo de personagens mulheres, ensine seus alunos a admirar mulheres. E tome sempre muito cuidado para não nos assustar porque temos, sim, medo de vocês. Principalmente se não te conhecemos.

[post original: https://www.facebook.com/heloisamelino/posts/10206308503421994 ]

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