sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Não existe racismo no Brasil

[Não existe racismo no Brasil]
Estava eu, linda, loira e japonesa, voltando de uma aula fantástica daJaqueline Gomes de Jesus sobre racismo no Brasil e de um jantar phynno de um subway requi(e)ntado com as divas Glaucia Tavares eLorena Braga, quando pego o busão na Lapa direção Copacabana. Ao virar na Glória, uma blitz. O policial faz sinal pra parar. Estranho, nunca estive em nenhum onibus que parou. Quem será que a polícia considerou sujeito suspeito? Quando vi que havia um rapaz negro (jura q vc já nao sabia?), cabelos com dread. Olhei pra fora, o policial que mandou parar olhava fixamente pro cara.
Entrou um policial pela frente do bus, dois pela porta de trás. O da frente colou o olho no rapaz negro e ordenou "Revista obrigatória, todo mundo com as mãos no banco da frente, por favor, pra colaborar". Nem um pio no ônibus. "Ali, revista a daquele ali que reclamou". O policial que entrou por trás, burro, nao entendeu e perguntou quem. "O de dread". Os dois policiais se dirigiram a ele.
Imediatamente me levantei e fui na direção do rapaz, q tava acompanhado por duas amigas a quem eu identifiquei brancas. Oficiais, boa noite. E me dirigi pro rapaz. Senhor, boa noite, eu sou advogada e ofereço a representação, a título gratuito, para acompanhar a revista, se o senhor desejar. "Eu quero." respondeu o rapaz assustado.
Uma moça, ao fundo do onibus, a quem identifiquei negra questionou a ação. "Engraçado. Ninguém reclamou. Pq vcs foram justo nele?" uma outra apoiou o protesto. As amigas do rapaz também protestaram. Vendo que alguma coisa se passava, o comandante da operação entra pela porta de trás: "Algum problema aí?"; ao que o policial, que já fazia a revista responde "Eu vim revistar o rapaz e essa moça se alterou e veio dizer que era advogada e ia acompanhar". Essa moça não, doutora. E eu vim oferecer meus serviços de representação, ele aceitou. O comandante virou-se pro rapaz
C: Você tá sendo alvo de alguma agressao? - O rapaz respondeu:
R: Constrangedor, né... Tô aqui de boas e o cara vem só me revistar?
C: Mas ele te tratou de alguma forma errada? A revista tá dentro da lei.
R: O policial ali da frente que mandou ele revistar o negão de dread.
Nisso, um homem cisgênero branco aparentemente heterossexual (sempre eles, ne? omis)
O: Eiei! Ele nao te chamou de negão, não! Falou que vc era o de dread. Negão, nao.
Eu virei pro omi: E quem foi que perguntou alguma coisa ou convidou você a falar?
O: Ué, vc tá aí falando, toda toda.
- Eu estou aqui na qualidade de advogada, to trabalhando.
O: Eu sou advogado também. (exaltado, claro)
- Advogado o que?! Advogado de quem? Do Estado? E vc lá tem procuração pra representar o Estado? Eu acabei de receber a procuração aqui desse senhor.
O comandante da operação mandou revistar as amigas, o policial foi com as mãos dele abrir as bolsas dela. O comandante veio revistar minha bolsa e ME pediu pra abrir a mochila, bolsa e eu mesma mostrar o que tinha. Não tendo encontrado nada, foram todos embora e o ônibus seguiu. O omi ficou lá achando que tinha dado lição de moral na polícia. É, grande lição a sua, de silenciar um negro que tá falando que foi alvo de racismo, ô! De boa, nem fala comigo não.
O rapaz negro e suas duas amigas brancas, que conversavam animadxs antes da intervenção racista policial, passaram o restante do trajeto em silêncio.
E a Jaqueline dizia que mais de 50% da população de pessoas negras já passou por uma dura da polícia ("baculejo", como dizem em Brasília). O "negão do dread" entrou pra estatística. Não existe racismo no Brasil?

original em: https://www.facebook.com/heloisamelino/posts/10202926678638488 

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