domingo, 22 de setembro de 2013

Fazendo Gênero 10 - críticas e sugestões



         Este texto foi lido por mim na Mesa Redonda "Trans-Lesbo-Homofobia e os Movimentos LGBT Transnacionais", que aconteceu dia 20/09/2013, último dia de Congresso, último horário de mesas em que se abriria a debates ao Público.

          Estavam na mesa: Felipe Bruno Martins (UFSC), Jules Falquet (Universidade Paris Diderot), Luma Nogueira de Andrade (10a Coordenadoria Regional de Desenvolvimento de Educação), Richard Miskolci (UFSCar) e Miriam Pillar Grossi (UFSC, Comissão Organizadora)

Trata-se de uma crítica a alguns aspectos do Congresso - seu formalismo, o academicismo e a reprodução de espaços de exclusão em um evento que contou com 5 mil pessoas inscritas, oriundas em sua maioria do Brasil, mas também da Argentina, Peru, Paris e outros países.

"          Bom dia, eu me chamo Heloisa Melino, sou advogada popular, faço Mestrado em Direitos Humanos, Sociedade & Arte na UFRJ, faço parte da construção da Marcha das Vadias do Rio de Janeiro e do Coletivo BeijATO.

O que eu tenho a dizer dialoga com todas as pessoas da mesa, tanto palestrantes, quanto debatedor e coordenadora. Vou falar de Nacionalismos, de pessoas Trans*, de Ensino e de Espaços de Exclusão. Desde já peço desculpas e a paciência de todas e todos, tanto da mesa, quanto do auditório, pois vou levar um tempo um pouco maior do que o esperado, mas o que eu tenho a dizer precisa ser dito.

Notei neste congresso, [o Fazendo Gênero 10], a pouca representação de pessoas que não estão na Academia. Me dei o trabalho de contar e das 129 pessoas que palestraram nas Mesas Redondas, apenas seis delas não eram identificadas como vindo de Universidades e Escolas. Isso se reflete, inclusive, no público do evento – quantas dessas 5 mil pessoas que estamos inscritas não somos pesquisadoras e pesquisadores? Aonde estão xs ativistas e os movimentos sociais?

Sou adepta das Teorias Críticas da Escola de Frankfurt e acredito que precisamos pensar numa Academia que dialogue com a Prática, justamente para dar base teórica mais consistente às reivindicações. E também o contrário. Me questiono muito, para que servem Teorias que estejam deslocadas da prática, deslocadas dos clamores da sociedade civil – organizada ou não? É preciso que pensemos uma Academia que não seja uma Torre de Marfim, caso contrário, corremos o risco de criar teorias herméticas e espaços de exclusão.

Também me surpreendeu – e muito negativamente – a execução do hino nacional na cerimônia de abertura deste Congresso. As pessoas ficaram de pé, colocaram a mão no peito, cantaram e aplaudiram algo que representa ORDEM e PROGRESSO. Essa mesma ORDEM que aqui debatemos que PRECISA ser mudada. E isso em um momento em que, no Brasil inteiro, há reivindicações populares e pessoas apanhando nas ruas por lutarem pela concretização do “Dever Ser” da Lei e de nossos Códigos – que é justamente o que temos o privilégio de debater aqui, neste espaço seguro. E isso sem falar de como é que devem ter recebido a execução do hino nacional as pessoas de outros países, que aqui estão a convite. Gostaria muito de saber da Comissão de Organização qual foi o motivo para execução do hino.

Tudo isso me leva a perguntar, estamos nós transgredindo ou sendo funcionais à Ordem, à Norma e ao Cis-tema? Acho oportuno falar, inclusive, da pouca presença de pessoas Trans* no evento. Eu até vi nomes de registro publicados na programação dos Simpósios Temáticos. Felizmente as coordenadoras dos ST em que estive presente chamaram essas pessoas à apresentação pelo nome que se identificam.


Por que é que nós nos colocamos como produtores do saber e de conhecimento, quando o que fazemos é beber das fontes de ativistas e de sujeitos de pesquisa, os verdadeiros protagonistas daquilo sobre o que pesquisamos e escrevemos? Pessoas que também não estão entre nós neste Congresso!

Não quero dizer que por não termos determinadas vivências não tenhamos legitimidade para falar e pesquisar esses assuntos – TEMOS, PODEMOS e DEVEMOS. Eu mesma pesquiso sobre o Reconhecimento Social das Identidades de Pessoas Trans* e sou cisgênera. Mas congressos com este tema,[o feminismo] e desta magnitude não podem reproduzir Espaços de Exclusão. É preciso que tenhamos posturas políticas e éticas CLARAS – sempre pela VISIBILIDADE e nunca pela Exclusão.


Se me permitem, trago aqui duas sugestões: A primeira é de que, nas próximas edições do Fazendo Gênero, convidem também pessoas ativistas para as mesas e a segunda é de que reserve-se verba para trazer aquelas e aqueles sobre os quais escrevemos e debatemos, mas que não têm o privilégio que nós temos, de acesso ao Ensino, tanto ao Superior Especializado, quanto ao Básico e Fundamental.


Obrigada."

Interessante, inclusive, que o congresso teve na Conferência de Abertura a execução do hino nacional brasileiro e na de Encerramento uma palestra questionando fronteiras, nacionalismo e a própria concepção de família. 
A palestra de encerramento proferida por Sara Schulman, o título é "Amigos antes de Família, Sociedade antes de Governo" (a tradução do título é minha e livre, pois acho que mais adequada que a tradução oficial do NIGS). 

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